Escolas dão aulas extras para alunos recuperarem conteúdos perdidos

Colégios oferecem reforço para estudante que teve dificuldade com ensino virtual durante a pandemia

Depois de quase dois anos de aulas remotas e híbridas, os estudantes devem chegar às escolas em 2022 em diferentes níveis de desenvolvimento —seja por falta de acesso aos recursos digitais ou então por dificuldades de adaptação ao modelo.

Para que ninguém saia prejudicado, escolas públicas e particulares estão preparando estratégias de recuperação.

Em colégios particulares, o mais comum serão esquemas de reforço personalizados, como o que já está sendo promovido pelo Colégio Santa Maria, na zona sul de São Paulo. “A escola oferece no contraturno um apoio pedagógico, sem custo extra. Pode ser individual, em duplas ou trios”, conta a orientadora pedagógica Márcia Almirall.

Mesmo antes da pandemia, a escola já fazia esse tipo de trabalho, mas agora ele ganhou escala e importância.

Mas esse processo não pode ser encarado como um castigo. A orientadora faz questão de mostrar às famílias que não se trata de falta de esforço por parte dos estudantes.

“Foi uma questão de adaptação. Criança que é mais sinestésica, que tem mais necessidades motoras ou relacionais, em geral teve uma perda maior”, afirma.

Personalizar atividades é a aposta da Luminova, rede de cinco escolas no estado de São Paulo. “A nossa preocupação é entender demandas e dificuldades individuais. Estamos identificando quem teve a saúde e a aprendizagem afetadas”, diz Yan Navarro, diretor acadêmico da rede.

Segundo Navarro, o diagnóstico não pode ser resumido à aplicação de uma prova. “É um trabalho diário, complexo, que deve ser feito durante as aulas”, afirma.

Ana Cristina Dunker, diretora da escola Carandá, na zona sul de São Paulo, defende que todas as escolas devem programar estratégias de recuperação. “Só o retorno vai nos dar noção do que é retornar, porque nunca vivemos isso. A pandemia vai deixar marcas, mas não necessariamente de deficiências.”

Estatisticamente, diz ela, o nível de alfabetização dos alunos da escola que passaram para o 3° ano em 2021 foi similar aos anos anteriores. “Talvez terem vivido um contexto tão diferente torne esses jovens até mais hábeis para pensar a história.”

Para uma recuperação efetiva, as instituições devem olhar para além dos conteúdos, defende Wagner Borja, diretor da escola Gracinha, na zona sul de São Paulo. “A gente se preocupa com as perdas de aprendizados cognitivos, mas devemos nos voltar para a questão da perda de convívio que só a presença física na escola proporciona.”

Para ele, professores terão de fazer um esforço extra dentro do horário comum para recuperar certas habilidades dos alunos. “As perdas não têm mensuração simples. É no convívio que se percebe o que ficou para trás”, afirma.

Na opinião de Cristina Nogueira Barelli, coordenadora do curso de pedagogia do Instituto Singularidades, o ano de 2022 será um momento para redimensionar as expectativas. “Passamos por algo que demandou um ritmo diferente, conteúdos diferentes, outros tipos de aprendizado.”

Para a pedagoga, a alfabetização foi uma etapa que ficou especialmente prejudicada, porque depende da intervenção direta do professor. Ainda assim, com um bom diagnóstico para rever as estratégias, ninguém sairá prejudicado. “Tem que reorganizar o currículo, mudar de propostas.”

Mesmo nas redes públicas, com números maiores e grande diversidade, bons diagnósticos e estratégias amplas podem promover a recuperação de aprendizagens, segundo Barelli. “Os contextos são muito diferentes. A rede tem de fazer uma análise do quanto o modelo remoto chegou aos estudantes. Depois, precisa fazer uma proposta de intervenção sistemática.”

Uma das formas de aumentar a aprendizagem comprovada cientificamente é ampliar o horário de aulas. As evidências apontam que o tempo extra leva a melhores resultados se as atividades forem conectadas ao currículo.

O município de Sobral, no Ceará, que nas últimas décadas deu um salto no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), prevê para 2022 programas de reforço e reposição para todos os estudantes no contraturno. “Levando em conta as dificuldades de acesso, a recuperação precisa alcançar a todos”, afirma Herbert Lima, secretário de educação da cidade.

As iniciativas podem mudar de acordo com o avanço dos alunos. Por isso, o município organizou diagnósticos frequentes para os próximos dois anos. Para dar conta de atender os alunos por mais horas, vão ser contratados mais 800 professores. Também vai ser ampliado o número de psicólogos, de 15 para 50.

Reforçar o corpo docente e ter mais alunos em tempo integral são algumas medidas adotadas pela rede estadual de São Paulo. Atualmente, 1.077 escolas fazem parte do Programa de Ensino Integral. No próximo ano, o número deve chegar a 1.855. O aumento de carga horária exigirá a contratação de quase 10 mil novos docentes.

Para o ensino médio, etapa em que há um problema grande de evasão, o governo criou uma bolsa de R$ 1.000 por ano para alunos que frequentarem no mínimo 80% das aulas e estudarem duas horas por dia no aplicativo da rede.

“Não adianta ter um ótimo programa de recuperação se o aluno abandona a escola”, diz Caetano Siqueira, coordenador da Coped (Coordenadoria Pedagógica).

https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2021/09/escolas-dao-aulas-extras-para-alunos-recuperarem-conteudos-perdidos.shtml

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