Na primeira infância, escola e família precisam falar a mesma língua

Na primeira infância, escola e família precisam falar a mesma língua

Proposta de trabalho pedagógico é um dos itens fundamentais a considerar na hora de escolher onde matricular as crianças pequenas, afirmam especialistas

Matéria publicada na Folha de SP em 07/09/2024

Na hora de escolher a primeira escola das crianças, há muitos detalhes que as famílias precisam considerar. Porém, de acordo com os especialistas, a atenção a aspectos relevantes, como infraestrutura, rotina de cuidados e localização, por exemplo, não deve fazer com que se deixe de lado o mais importante: a proposta de trabalho pedagógico, a sintonia de valores e a disposição para trabalhar em parceria.

A pedagoga e mestre em psicologia Cláudia Tricate, diretora do Colégio Magno/Mágico de Oz, em São Paulo (com unidades em Santo Amaro e Campo Belo), diz que a forma como o colégio entende e aborda o período da infância que vai até os seis anos deve estar alinhado com o pensamento, os objetivos e os valores da família. “É fundamental que falem a mesma língua no que diz respeito à educação, ainda mais nesta fase tão decisiva para o desenvolvimento das crianças”, acrescenta.

A especialista destaca ainda que, para essa sintonia se estabelecer, é ideal que os educadores sejam capazes de traduzir seu projeto pedagógico de um jeito compreensível e palpável, que vá além teoria. Um aspecto que merece atenção é a relação entre cuidado e autonomia.

“A escola precisa deixar que a criança faça muitas coisas sozinha, e isso não significa falta de cuidado”, explica Cláudia. “Os pais talvez prefiram que se dê comida à criança, em vez de deixar que ela coma sozinha, para garantir que se alimente bem. Mas é possível se antecipar e mostrar a importância da autonomia para a boa alimentação.”

Segundo Claudia, o Colégio Magno/Mágico de Oz põe em prática esses conceitos no relacionamento as famílias. “Estabelecemos um diálogo transparente e um trabalho de parceria, no ensinar e no educar”, afirma.

Para o psiquiatra e psicoterapeuta Wimer Bottura, que aconselha famílias e é cofundador da Universidade de Pais, instituição especializada em educação parental, as expectativas da família sobre a escola, assim como as expectativas da escola sobre a família, devem ser esclarecidas para que não pairem pontos obscuros. “Trata-se de uma extensão da família para fazer o que ela não pode fazer sozinha”, afirma.

Para ele, família e escola não são rivais, são parte do mesmo todo, cada lado com seus papéis específicos, mas que se complementam. Conversas prévias sobre aspectos considerados essenciais, conhecimento mútuo e espírito de parceria contribuem para evitar conflitos futuros.

O QUE O MEC RECOMENDA CHECAR NA ESCOLINHA

  • As salas de atividades e demais ambientes internos e externos são agradáveis, limpos, ventilados e tranquilos, com acústica que permite uma boa comunicação?
  • Há reuniões com familiares pelo menos três vezes por ano?
  • Os familiares recebem relatórios sobre as vivências, produções e aprendizagens pelo menos duas vezes ao ano?
  • A instituição tem proposta pedagógica em forma de documento?
  • A instituição permite a entrada dos familiares em qualquer horário?
  • Existe local adequado para receber os pais ou familiares?
  • Há local adequado para aleitamento materno?
  • As professoras têm, no mínimo, a formação em nível médio ou magistério?
  • Todos os pontos potencialmente perigosos do prédio são protegidos para garantir a circulação segura das crianças e evitar acidentes?
  • A instituição tem procedimentos preestabelecidos que devem ser tomados em caso de acidentes?
  • Há no mínimo uma professora para cada grupo de 6 a 8 crianças de 0 a 2 anos?
  • Uma para 15 crianças de 3 anos?
  • Uma para cada grupo de 20 crianças de 4 a 6 anos?

Vai nessa linha a proposta de trabalho da Escola Lourenço Castanho, na Vila Nova Conceição, em São Paulo, buscando um equilíbrio entre educação e cuidados.

“A escola não é a casa da avó ou da tia, nem o clube, nem um hotel. Deve ficar claro para os pais quais são os compromissos com o desenvolvimento e o aprendizado das crianças. Além de serem informados sobre a rotina de cuidados tomados, os pais precisam saber dos conhecimentos construídos por meio das brincadeiras e jogos de faz de conta, por exemplo”, destaca a diretora geral Cristina Tempesta.

Por isso mesmo, quando o assunto é a infraestrutura da primeira escola, não podem faltar os chamados “espaços educadores“, com mobiliário e materiais adequados para que as crianças possam aprender brincando, explorar e fazer descobertas e ter contato com a natureza.

“O ambiente escolar é constituído pelo espaço e pelas formas de ocupá-lo, propiciando às crianças experiências nas diversas linguagens e materiais, por exemplo, além da possibilidade de se expressarem e aprenderem”, diz Débora Vaz, diretora pedagógica do Colégio Santa Cruz, localizado na zona oeste da capital paulista.

A escola se prepara para receber a primeiríssima infância (de 1 a 3 anos) a partir de 2025.

Os especialistas também ressaltam que todos os colaboradores contribuem em alguma medida para os processos educativos nas etapas iniciais da infância, porque cuidados e estímulos andam sempre lado a lado. “Enxergamos o educar e o cuidar de forma integrada, uma atividade a ser desempenhada por professores e educadores com formação apropriada para isso”, afirma Débora Vaz, do Santa Cruz. “Os profissionais da escola têm de estar preparados para identificar sinais indicativos de bem-estar e lidar com situações delicadas”, lembra Cristina Tempesta, da Lourenço Castanho.

Em relação ao número ideal de crianças por sala na primeira infância, Cristina explica que varia de acordo com o espaço físico e a formação dos profissionais. Em geral, crianças de um ano e meio convivem bem com até 12 alunos por turma, com dois professores ao lado delas e ambientes de boa qualidade. A cada ano é viável somar mais quatro crianças, chegando ao final da educação infantil com até 24 alunos por sala.