Kamila Pecorari , funcionária do Instituto de Biociências (IB) da USP
Desde pequena eu frequentava a USP – campus de São Carlos. Adorava essa rotina: andava a pé por todo o campus (até hoje não entra ônibus), sempre contemplando a natureza, e depois ia na sala da minha mãe para que na sequência fossemos na cantina lanchar. Como eu nunca pude comer na cantina da escola, pra mim, era o máximo comer algo gostoso naquela cantina.
Eu sempre pensei que, pra mim, um emprego espetacular daqueles era impossível. Eu via a USP como algo inatingível tanto academicamente, quanto profissionalmente.
Terminei o ensino médio e fui cursar Senac. Comecei em outro curso, mas, antes do 1º ano, consegui mudar para técnico em secretariado, minha mãe tinha me dito que poderia ser um diferencial ter o registro de secretária.
Comecei a cursar Administração em uma faculdade particular, trabalhava para pagar a minha faculdade.
Por força do universo (aqui mereceria outra história), após 1 ano e 4 meses, entrei por transferência na Unesp em Araraquara, para o curso de Administração Pública. Nesse mundo, foi a 1ª vez que cogitei a ideia de ser funcionária pública, pra mim, era algo impossível, eu tinha muita dificuldade com algumas matérias, em especial com a matemática e zero experiência com concursos.
Para cumprir o estágio obrigatório com a duração de 2 anos na área pública, trabalhei no Banco do Brasil. Foi então, que já no 3º ano da universidade, vi um anúncio no mural sobre um estágio na USP. Novamente aquele pensamento limitante: “tantos alunos querendo esse estágio”, mas fui lá e participei do processo seletivo. Sem saber que eu era filha de uma funcionária, mediante a um empate nas notas, o professor me escolheu devido ao diferencial que, pra ele, era importante: melhor domínio da informática.
Nossa, eu nem acreditava que ia ganhar aquele salário como estagiária e que trabalharia naquele ambiente tão familiar pra mim, desde criança. Foi um sonho, fiz meu TCC sobre o IFSC [Instituto de Física de São Calos] e o quanto aquela instituição aplicava diversos conceitos vistos no curso de Administração Pública. Eu passei a sonhar com o meu nome (como funcionária) na lista telefônica do IFSC. Aquele lugar era referência, eu adorava!
Infelizmente, eu não ia participar da minha formatura, assim como não participei da formatura da 8ª série, não tinha condições financeiras. Terminado o estágio, diante da dificuldade no mercado de trabalho, aceitei um serviço no comércio, fora da minha área de interesse. Fiquei 5 meses até que a empresa faliu, mas foi com ele que acabei pagando a minha formatura no último minuto, uns 2 meses antes, foi linda e emocionante! O pessoal do BB (desde a minha saída) e depois o pessoal do IFSC me incentivavam a passar no concurso público, pra mim, continuava a soar como impossível, mas estava difícil achar um emprego e pensei: “agora é a hora”. Tinha um edital aberto em uma unidade da USP. Eu morava com a minha vó e, conversando, ela me incentivou (me bancaria), e passei a estudar por mais de 18h por dia. Literalmente abri livros de 5ª série e aprendi aquela matemática que te coloca pra pensar.
Eis que eu venci o impossível: eu passei no meu 1º concurso (acho que em 3º lugar). Calma, ainda não comemore! Não seria tão fácil concursar na USP. Eis que todos os concursos da USP foram cancelados pelo MP [Ministério Público] devido a irregularidades. Ao mesmo tempo, fui convidada pelo Prof. Glaucius para trabalhar em um projeto e aceitei. Olha eu aí de volta ao IFSC! Mal sabia eu que, naquele mesmo ano, eu passaria nos meus próximos concursos.
Trabalhei 1 mês na Prefeitura Municipal de São Carlos (após quase faltar do concurso devido a uma crise de espirros ininterruptos e fazer a prova sem nenhuma crença que passaria, novamente a informática foi o diferencial) e então o sonho de menina foi realizado: vi meu nome na lista de funcionários do IFSC, unidade que trabalhei até vir de transferência (para casar com um paulistano) para o IB [Instituto de Biociências].
Curiosidades: fiz entrevista no IB, mas consegui a transferência para outra unidade, eu moraria em Campinas (com o noivo de São Carlos) e trabalharia em SP. Já com o papel da transferência, desisti e cancelei o casamento marcado na igreja. Num segundo momento, namorando um paulistano, eu estava com o papel de transferência para uma unidade do Quadrilátero, desisti e acabei escolhendo o IB.
Foram vários fatores que juntos contribuíram para eu estar hoje em uma instituição pela qual desde criança eu sentia admiração e hoje a palavra é gratidão.