Educadora questiona proibição de celulares no ambiente escolar
“A educação não pode ser dissociada do compromisso social do professor”. Essa foi a mensagem principal da palestra de abertura da 25ª Jornada de Educação das Unidades de Ensino de Natal (Jenat), proferida pela professora doutora Cláudia Viegas Tricate Malta. Psicóloga, pedagoga e especialista em psicopedagogia, Cláudia defendeu a educação como um processo integral, no qual escola e família têm papéis indissociáveis na formação dos alunos e também questiona a recente Lei Federal acerca da proibição dos celulares nas escolas.
Para a especialista, o conceito de letramento vai além da simples aquisição da leitura e escrita, englobando a compreensão do mundo e a interação entre profissionais da educação e os responsáveis. “As pessoas muitas vezes ficam naquela dúvida de que a família educa e a escola ensina, e isso não existe. Nunca existiu e, mais do que nunca, deixa de existir”, afirma e destaca a importância de considerar o aluno em sua totalidade, rejeitando a ideia de que ele assume identidades distintas em diferentes contextos.
“Não existem dois alunos, um em casa e outro na escola. Não existem três, o que está na rua, o que está na escola e o que está em casa. Existe um aluno. E existe um professor. O professor também não é um quando está aqui e outro quando está ali. Somos seres sociais”, pontua Cláudia Viegas Tricate, que também coordenou a implantação da metodologia de avaliação da Educação Infantil do Instituto de Desenvolvimento e Avaliação Educacional (IDÉIA-SM).
Durante a palestra, a especialista também trouxe um debate sobre a proibição do uso do celular nas escolas. A educadora afirma que uma lei desse tipo pode ter efeitos adversos, reduzindo a autonomia dos alunos no gerenciamento do uso da tecnologia. “A parte boa é que todo mundo parou para olhar. Essa é a parte boa. A parte não boa é que uma lei tira, em grande parte, a participação dos meninos e de nós, adultos, nisso”, explica.
A Lei nº 15.100/2025, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no dia 13 de janeiro, estabelece que aparelhos pessoais não podem ser utilizados durante as aulas, recreios e intervalos, salvo em situações pedagógicas autorizadas por professores ou por questões de saúde e acessibilidade. Também estão previstas estratégias para lidar com a saúde mental dos estudantes e treinamentos sobre o uso excessivo de dispositivos digitais.
Na visão de Cláudia, legislação pode ser comparada à de anti-bullying, argumentando que uma regulação por si só não é suficiente para provocar mudanças de comportamento. “Se eu pergunto para um adolescente por que ele não pode praticar bullying, a resposta não deveria ser ‘porque existe uma lei’. Deveria ser ‘porque machuca pessoas’. A lei não pode se sobrepor a isso”, exemplifica.
Diante disso, a especialista enfatiza a necessidade de ensinar os alunos a se autorregularem e desenvolverem um relacionamento mais consciente com a tecnologia. “Uma lei não pode se sobrepor à autorregulação. Eles precisam ver valor nisso”, frisa. Segundo ela, a proibição do celular, sem um trabalho pedagógico adequado, pode resultar em estratégias dos alunos para burlar a regra, em vez de promover uma reflexão real sobre o uso da tecnologia.
A educadora destaca que, para promover um uso consciente do celular, é fundamental que professores e famílias ofereçam alternativas e direcionem os alunos, em vez de apenas restringir. “O papel do professor é pensar nisso, se colocar no lugar deles. O papel do educador é entender o que está acontecendo com os alunos. E pensar no quanto é difícil, para eles e para nós. Embora todos nós aprendamos com quem sabe mais, o papel do adulto é sempre determinante”, afirma.
A Jornada de Educação das Unidades de Ensino de Natal chegou à sua 25ª edição reunindo professores e especialistas para debates sobre o futuro da educação. O evento foi promovido pela Secretaria Municipal de Educação (SME) de forma presencial no Teatro Riachuelo. O evento deste ano teve como tema “Letramentos para ser e agir no mundo: compromisso pedagógico e social”.
De acordo com o secretário municipal de Educação, Aldo Fernandes, a jornada é um momento aguardado pelos professores para troca de experiências e atualização profissional. “A Jenat abre o início de nossas atividades escolares. É um momento para ouvir novidades e inovações, congregando professores de todos os segmentos. A educação é um ato contínuo de aprendizado e troca”, afirma.
Durante o evento, a SME também prestou homenagem a 155 alunos da rede municipal aprovados no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). “Fizemos um certificado e vamos entregar um a um para elogiá-los e honrá-los por esse feito. Queremos mostrar que todos podem”, destacou o secretário.