Na semana em que se encerra o prazo para tirar o título de eleitor, conversamos com Felipe Soutello, estrategista e especialista em campanhas políticas, e com jovens para saber o que eles pensam sobre o cenário eleitoral.
São 6 milhões de novos votos que podem chegar às urnas este ano. São 6 milhões de jovens adolescentes brasileiros com idade entre 15 e 18 anos que devem votar pela primeira vez no país. O que representa não só uma parte significativa de votos que irão para os candidatos, mas uma possibilidade de mudança de cenário na política brasileira.
Não à toa, os últimos meses foram marcados por campanhas assíduas nas mídias sociais para incentivar esses seis milhões a tirarem o título de eleitor. Artistas, celebridades, blogueiros, youtubers, o próprio TSE que fez 6,8 mil tuítes, conforme dados da própria plataforma e alcançou mais de 88 milhões de pessoas, o TRE, e na última semana ainda tivemos os atores americanos Leonardo DiCaprio e Mark Ruffalo.
Existe um olhar esperançoso nesta nova leva de eleitores que chega às urnas e mesmo entre a descrença dos adolescentes com a política brasileira, o desanimo com a polarização e até mesmo a falta de informação, as campanhas tiveram resultados muito positivos.
No último mês, 445 mil novos títulos de eleitor foram tirados. Segundo dados do TSE, Tribunal Superior Regional, 28% superior ao mês de março. Semana passada, a Secretaria de Educação do Estado lançou a campanha “Tire seu Título de Eleitor”. Será oferecido para os estudantes da rede infraestrutura e auxílio dentro das escolas para que façam todo processo de emissão durante o período letivo.
“É uma ação que destaca a importância do exercício da cidadania, e o voto é o princípio básico da cidadania. O futuro do Brasil é hoje e está aqui na escola com os nossos jovens”, declarou a Secretária Estadual da Educação, Renilda Peres.
Os números devem aumentar ainda mais este mês, mas, ao longo de todo este processo, uma pergunta chama atenção: por que tem sido tão difícil levar os jovens a tirarem seu título de eleitor? Por que adolescentes brasileiros entre 15 e 18 anos estão tão resistentes em participar do processo político brasileiro?
Para Felipe Soutello, estrategista e especialista em campanhas políticas, existe uma falta de valorização e educação para o tema. “Temos um debate binário, isto é, as redes sociais vieram para trazer coisas boas, mas tem as ruins também. O lado bom diz respeito aos valores democráticos. O lado ruim é que a conversa não acontece. Ela fica de lado, porque existe a tal polarização, além de uma intolerância que é ruim”.
“Outro ponto é que a linguagem da política ainda é muito formal. Ela precisa ser mais acessível ao jovem. Quando se faz política é preciso pensar no todo. Temos o momento que também é desanimador para o jovem de hoje. Estamos vivendo um cenário de empobrecimento muito grande, inclusive culturalmente falando. Falta emprego, falta estudo. Falta muita coisa para eles”, explica.
Isabela Rezende, 16, aluna do colégio Santa Maria, concorda. Para ela, que tirou seu título em outubro de 2021, não existe inclusão na política brasileira, o que incluiu o sistema eleitoral. “O Brasil ainda é um país inexperiente na prática da democracia. Todas as conquistas para votar são muito recentes e, apesar de termos um sistema eleitoral mais tecnológico, não temos muita inclusão na nossa política. Ela precisa melhorar muito para representar não só um grupo, mas sim a todos. Também acho que nós precisamos ter mais pautas sobre política dentro das escolas”, diz.
Para a estudante que vai votar pela primeira vez, é essencial que a democracia não considere apenas o princípio da maioria, mas também princípios de justiça social, abrindo espaços de fala para as minorias, além de construir leis e políticas públicas que atendam aos seus interesses e necessidades. Isabela acredita que movimentos como os do TSE funcionam muito, inclusive como já aconteceu nos Estados Unidos, quando artistas e celebridades se envolveram para pedir aos jovens a tirarem seu título e votarem.
A estudante Luiza Campello, 16 anos, aluna do Colégio Equipe, reforça a fala. Para ela, muitos jovens menores de 18 anos optam por não fazerem o título porque não é obrigatório, mas pondera que a influência familiar e da escola são fontes essenciais para o incentivo dos jovens nas eleições e na tomada de decisões que precisam ser feitas para decidir o futuro do país.
Luiza, que também já tirou seu título e vai votar pela primeira vez, atribui à família a consciência e o interesse que tem em relação a política, e diz que desde as eleições de 2018 sentiu necessidade de se envolver mais. “Acho que a política é essencial para todxs e tenho uma opinião muito forte de que a discussão da política deve ser normalizada e não tratada como um tópico reservado para uma certa idade”.
O que as estudantes falam é o que defende Soutello. Para ele, falta educação para a democracia e faltam incentivos para que os jovens se envolvem mais com a política do país.
“Hoje em dia, os jovens sentem ou percebem que não têm espaço para a conversa quando o assunto é política e daí se sentem desanimados, desiludidos. Eles não se sentem relevantes no país porque não são incluídos. A verdade é que eleição não muda a nossa vida. Ela muda de volume. Mas também é fato que a gente tá vivendo um choque o tempo todo. Não há um respeito pelo perdedor ou ganhador como deveria ser, daí dá medo opinar. Difícil”.
Adolescentes dizem ter medo do cancelamento nas redes sociais e optam pelo silêncio muitas vezes. José de Pinho, 17, do Equipe, tirou o título de eleitor no final de fevereiro e acredita que a política, de maneira geral, tem de ser um campo de conversas e de respeito para não vivermos o caos geral atual.
“Na minha opinião, eu acho que o desânimo da galera com a política não tem a ver com a falta de candidatos que a represente. Não descarto a hipótese, mas não acho que é só isso. Muitos jovens pensam que o seu voto não vale nada e que talvez sua participação não vá fazer diferença. Há pouco incentivo para os jovens entenderem melhor o que é política, como ela funciona, quem é quem”, fala.
Tanto para José como para Isabela, é preciso ter mais conteúdo educativo sobre política dentro das escolas, justamente para que os jovens se sintam parte e saibam quem é quem e o que cada representante faz, como ele atua e quais são as suas responsabilidades. “Muitos amigos consideram a política algo distante, e que não vão votar, porque não os afeta. Sentir-se representado é meio caminho andado”, alerta o aluno do Equipe.
Para Felipe Soutello, as famílias precisam conversar mais em casa e as escolas precisam desenvolver “um trabalho com valores e responsabilidades como respeito, honestidade e justiça para auxiliar na formação de uma mentalidade e atitude democrática”.
Camila Lacerda Souza, 16, da escola Carandá Educação, defende que a escola, como sendo o primeiro espaço social em que os jovens convivem, tem grande responsabilidade de prepará-los para a sociedade fora dela, neste caso, a política.
“Informar, mostrar dados reais, explicar e demonstrar para os alunos como funciona o processo eleitoral e a função de cada um dentro dele. O incentivo a criação de grêmios e coletivos é imprescindível como preparo, forma de representação e discussão das pautas de interesse dos alunos, exercendo seu poder político dentro da instituição” expõe a aluna.
Outro ponto diz respeito à falta de projetos plausíveis que atendam àqueles que realmente necessitam. “Acredito que se nos unirmos, especialmente nós os jovens, temos chance de resgatar essa democracia que não tem atendido a todos, principalmente às minorias que, sem apoio, estão se fragilizando,” afirma Camila.
Clara Zerwes, 17, aluna do Santa Maria, ainda não tem o título de eleitor, mas a estudante diz que pretende tirar logo e que considera importante jovens da sua idade participarem ativamente da vida política do país. “Em um momento como esse em que as eleições presidenciais vão acontecer, é necessário que os jovens se engajem mais, porque será importante para o futuro de todos”, declara.
Não resta dúvidas que ingressar na vida política é um passo fundamental para todos os adolescentes. Até mesmo para que eles se sintam cada vez mais representados em suas causas e bandeiras e para que façam parte, passem a serem vistos e “considerados”. É preciso dar voz para que tenham voz e este processo é um exercício fundamental da democracia e da própria cidadania.
“A política é um assunto chato”, diz Soutello. “Mas a educação para a democracia tem um papel importante na construção e formação de valores gerais e definitivos dentro da sociedade, bem como na formação para a tomada de decisões políticas em todos os níveis”.
Tá aí o porquê de tanto incentivo para que os jovens adolescentes brasileiros tirem o título de eleitor. Mais do que fazer parte da próxima eleição presidencial, é aprender a fazer parte do sistema democrático brasileiro. É também exercer sua cidadania numa outra esfera a qual ainda não estão habituados e integrados. #boravotar