Sesi Com@Ciência discute rumos da tecnologia na educação
A quarta edição do Sesi Com@Ciência teve a participação de mais de 17 mil pessoas, incentivando o interesse pelas ciências.
Matéria publicada pela Fundação Telefônica Vivo em 14/10/2022 – Considerado um dos maiores eventos de educação do Rio Grande do Sul (RS), a Mostra Sesi Com@Ciência reuniu, entre os dias 5 e 6 de outubro, mais de 17 mil pessoas para discutir temas relevantes relacionados à ciência, inovação e tecnologia no ensino brasileiro.
Realizado no Centro de Eventos da Federação das Indústrias do estado (Fiergs), em Porto Alegre, a quarta edição do evento teve a intenção de fortalecer a construção de uma educação básica de qualidade, estimulando principalmente as temáticas científicas e tecnológicas.
Durante os dois dias, a Mostra Sesi Com@Ciência divulgou mais de 170 projetos desenvolvidos nos programas de educação do SESI- RS, incentivando a pesquisa científica e impulsionando o interesse pelo estudo das ciências. Além disso, o evento também proporcionou à comunidade escolar uma agenda de palestras e oficinas.
A criança que deve ensinar o computador
Entre os destaques da Mostra Sesi Com@Ciência esteve uma série de discussões ao redor do uso de ferramentas tecnológicas no universo do ensino. Palestras sobre educação maker, STEAM e o mercado de trabalho, ciências da aprendizagem e jogos online despertaram o interesse de diversos participantes da Mostra.
Na palestra “Tecnologia da inovação e da criatividade a favor da Educação”, Paulo Blikstein, professor da Universidade de Stanford e diretor do TLTL (sigla em inglês para Laboratório de Tecnologias Transformativas), refletiu sobre o que chamou de paradigma da transição de conhecimento. “Em meados do século passado foram sendo inseridas diversas tecnologias de ensino, mas o princípio era: a máquina faz uma pergunta, o aluno responde, e passa pra próxima se acerta. Muitos sistemas de ensino online são exatamente assim até hoje”, critica o professor. “Claro que esses recursos podem ser úteis como reforço educacional, o problema é quando isso vira a espinha dorsal da educação”, afirma Paulo, referindo-se ao período de aprendizagem à distância imposto pela pandemia.
Ele defende, então, um outro jeito de olhar para as tecnologias na educação, de forma que estimulem a criatividade e experimentação dos estudantes. Citando o pensador sul-africano Seymour Papert, Paulo afirma que “o computador não deve ensinar a criança, é a criança que deve ensinar o computador”. “O nativo digital sabe consumir tecnologia, mas não sabe produzir. É como saber ler um livro, mas não ter a capacidade de escrever, sendo uma participação limitada e perigosa, que pode causar danos para o bem-estar dos estudantes e para o seu desenvolvimento”, aponta. “Hoje, criar tecnologia é absolutamente central, levando em conta as inúmeras possibilidades de trabalho e emprego geradas por ela.”
Sesi Com@Ciência: Desafios da cultura maker
O professor também comentou sobre os desafios e oportunidades da cultura maker na educação. “Muitas escolas que tem um espaço maker não enxergam todo o seu potencial. Em muitos casos, as crianças imprimem um chaveiro na impressora 3D e fica nisso. Essa superficialidade é um problema grave, pois a escola pública acaba investindo em tecnologia que vira um monte de chaveiro e não aprofunda nenhum projeto, nem incentiva o aluno a refletir.”
Ou seja: ter um espaço maker é um bom início para a escola que quer abrir espaço para essa cultura, mas é insuficiente se não estiver atrelado a um bom projeto pedagógico. “Temos que considerar que a escola tem objetivos de aprendizagem, a partiri da base curricular nacional. O nosso trabalho enquanto educadores é construir essa ponte entre currículos e tecnologias, estimulando a criatividade e a inventividade que vão apoiar o aluno a desenvolver autonomia e, consequentemente, criar a base para a emancipação acontecer dentro da sala de aula.”
Coordenador do Laboratório de Inovação Tecnológica na Educação (LITE), André Raabe discute o papel do professor nesse cenário. “Ele circula e participa dos projetos, senta e faz junto, colabora e problematiza, mas ele não é mais a figura central da aprendizagem. Enquanto professor maker, em vários momentos eu me ausentei da sala e, quando voltei, percebi que ninguém tinha sentido minha falta”, revela. “Os alunos estão engajados, fazendo as atividades com gosto e interesse. Essa mudança da relação aluno-professor é muito salutar.”
André reforça que o estabelecimento de um espaço dedicado ao mão na massa é importante, mas a mudança principal de fato está na prática pedagógica. “Eu posso fazer um kit maker com uma caixinha, palitinhos de picolé e cola quente e transformar uma aula comum em um momento mais criativo e inovador”, observa. “Porém, o espaço maker torna essa aprendizagem ainda mais potente, trabalhando com projetos mais a longo prazo que vão envolver mais conteúdos e conceitos. Para as escolas que já possuem esses espaços, o grande desafio atual é fazê-lo dialogar mais com as disciplinas tradicionais.”
Buscar equilíbrio entre online e offline
Na mesa sobre “Jogos online no desenvolvimento integral e educação das crianças”, a diretora de Educação e Cultura da Infância no Instituto Alana, Raquel Franzim, refletiu sobre o papel da educação em um novo espaço social que as crianças estão presentes: a internet.
“O jogo faz parte de um universo lúdico e simbólico dos seres humanos. Brincar é uma linguagem expressiva, corporal, gestual e simbólica, sendo uma prática social comum na infância. No entando, a internet captura a atenção de todos nós e, de maneira ainda mais perversa, a das crianças, que têm dificuldade enorme de se desconectar e vivenciar experiências reais importantes”, opina. “As crianças precisam ser protegidas na internet, pois jogos eletrônicos e digitais podem causar dependência. Eles não são vilões, mas seu uso inadequado pode trazer efeitos negativos.”
Ela defende um maior equilíbrio entre as atividades online e offline. “Quanto mais tela uma criança usa, é preciso mais natureza, mais interações de outra ordem, fazendo a mediação do presencial para o online. O jogo tem um papel potente, mas precisa ser equilibrado com a vida da criança”, finaliza.
É possível rever o evento na íntegra aqui.