Marcante Thiago do Carmo Nunes, egresso da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) da USP
O momento mais marcante na minha história na USP foi o Discurso do Orador das turmas de Engenharia da USP-Lorena 2018 que emocionou a todos no auditório:
Boa noite a todos os presentes, professores, funcionários da Universidade, formandos e familiares. A responsabilidade de falar em nome dos formandos é gigantesca, do tamanho das glórias e trajetórias de todos os presentes nesta noite única em nossas vidas.
Quando recebi o convite para ser orador da turma, logo pensei: – que baita responsabilidade. Não iria falar somente em nome da turma de Engenharia Física, que, diga-se de passagem, está muito bem representada e batendo recordes de formandos. Representar amigos e colegas que compartilharam essa experiência única e talvez a mais enriquecedora de nossa vida que foi a passagem por Lorena é de longe um prazer imensurável. O momento é de comemoração, superação e principalmente de emoção.
Agradeço, primeiramente, à vida! Por nos mantermos fortes e capazes de chegar ao momento final de nossa fase de universitários. Talvez não mais acessar o sistema Júpiter e admirar os quadradinhos verdes com as disciplinas concluídas tenha sido o maior sinal de que esta fase se encerrou.
Mas o motivo deste discurso está em justamente recapitular momentos de nossas trajetórias que foram capazes de marcar nossa alma para sempre. Cada um aqui possui sua própria história, conquistas e renúncias de uma caminhada inteira que não podemos deixar de contar com orgulho. Trilhamos ao longo destes anos um caminho sem volta, o da maturidade.
Crescemos, pensamos e até mesmo agimos de uma maneira muito mais próxima que nossos pais do que nunca imaginamos antes, deixamos de lado o abismo que separava pais e filhos: “Você me diz que seus pais não entendem, mas você não entende seus pais”. Esse paradigma para muitos não vale mais. Não somos mais os mesmos garotos/garotas.
A ESCOLHA:
Engenheiros Químicos, Bioquímicos, Ambientais, de Materiais, de Produção e Físicos. Independente da carreira que vamos seguir daqui pra frente, todos nós enfrentamos a primeira das batalhas no processo de escolha de curso. Uma certeza planava em todos, queremos a USP. Mas, para muitos, como eu, a carreira a ser escolhida ainda era uma incógnita. Meu sonho era ser astrônomo, apaixonado pelo céu. Não tinha certeza se a opção da Fuvest era a que realmente eu gostaria de fazer, mas resolvi, como muitos, tentar algo novo.
AOS MESTRES:
Vimos nosso futuro sendo traçado com a lista final da Fuvest, e, para muitos, naquele momento seria necessário fazer uma outra grande escolha. Deparei-me com duas opções, e optei pela universidade de Itajubá. Viajei ao sul de Minas, me matriculei, e até tinha fechado uma república (meus pais não ficaram muito satisfeitos com a escolha da casa, já que na sala de estar havia duas mesas de sinuca e caixas de som gigantescas pela sala. Talvez esse não seja um critério de seleção para eles, mas para nós …).
Como iríamos ficar mais um dia na cidade, meu pai propôs que conhecêssemos Lorena, já que era uma cidade próxima e até mesmo visitar a tal da USP. Chegamos ao famoso DEMAR e, naquela tarde, conhecemos uma pessoa muito especial, que está aqui conosco hoje. Nesse momento, o fator mais importante e que me fez e ainda me faz acreditar na USP-Lorena se mostrou presente: as pessoas e paixão pelo que fazem por aqui.
Conhecemos uma figura ímpar, que nos apresentou toda estrutura, cada laboratório e funcionário do Demar com sua gentileza e educação. Conversamos por algumas horas, e a gentileza, colaboração e o brilho nos olhos de alguém que ama o que faz fez toda a diferença. Realizei minha escolha: viria para a USP Lorena.
Obrigado, Professor Durval. Você faz parte de tudo isso.
AOS AMIGOS QUE DEIXAMOS:
Chegava o tão esperado dia da matrícula, uma confusão de sentimentos. A euforia compartilhada com o medo. Medo que a mudança desperta. O mundo desconhecido chega com seu olhar enigmático e como isso nos afeta depende da forma como o recepcionamos. Centenas de pessoas, era possível identificar os outros calouros, e até mesmo apostar em quem estaria ou não em nossas turmas. Ao mesmo tempo, éramos acolhidos por outras centenas, com camisetas escritas Mamutes, EEL, e que queriam se aproximar e acolher a todos se prontificando a colaborar com repúblicas, entidades e tudo mais. Era possível ver sonhos compartilhados, espírito de equipe e experimentar o que viria pela frente a partir do olhar mais sincero daqueles que viriam a ser nossos colegas.
Gastei todo meu dinheiro com a primeira pessoa que me abordou, por sorte me ofertava um pacote de festas da primeira semana e uma caneca. Talvez tenha sido uma das mais acertadas decisões que tomei na vida.
Entre a matrícula e o início das aulas, a ansiedade apertava e foi na noite do dia anterior à ida para Lorena que senti a emoção da partida da forma mais difícil de lidar.
A primeira emoção foi durante a despedida dos meus avós. Talvez eles tenham sido as pessoas mais importantes da minha vida, pelo exemplo e pela história. Não queria sair da casa deles porque foi ali que vivi os momentos mais felizes até aquele momento e o medo de que eles pudessem partir sem a minha presença me dava um nó na garganta.
Depois de algumas horas com eles, precisava me despedir. Durante o último abraço, escutei-os falando pra mim: “Vai meu filho, seja muito feliz, e nunca se esqueça das pessoas que estão com você” e começaram a cantar no meu ouvido: “Quero levar o meu canto amigo a qualquer amigo que precisar. Eu quero ter um milhão de amigos, e bem mais forte poder cantar. Eu quero ter um milhão de amigos, e bem mais forte poder cantar”. Obrigado, Vó; obrigado, Vô. Hoje vejo que fiz o que me disseram e posso ver que o que fizemos de melhor na faculdade foi muito além de resolver derivadas e integrais. As amizades e experiências trocadas nesse tempo de convivência valem muito mais que qualquer outra coisa.
A FAMÍLIA:
Chegando em casa mais do que emocionado, fiz de tudo para esconder dos meus pais que estava sensibilizado. Dei um tempo, uma volta pela casa, até que resolvi entrar. Quando entrei, meu pai estava no computador, e me pediu para mostrar a república na qual iria morar. Apresentei a ele o Google Street View, já que era um serviço novo no Brasil, uma inovação tamanha que iria surpreendê-lo. Mostrei a ele a casa e, por coincidência, o quarto no qual eu iria ficar possuía uma janela para a rua. Quando comentei, ele deu um sorriso gigante. E eu, surpreso, então perguntei o porquê de tamanha alegria. Foi nesse momento que eu chorei como nunca antes em minha vida: “Filho, olha que maravilha, quer dizer que então toda vez que eu quiser te ver é só você ir para a janela que eu posso matar a saudade pelo Google”.
A pureza de uma relação entre pai e filho ficou marcada em meu coração.
A nossas famílias, que nos criaram com todo amor e que são capazes de abdicar de nossa presença para nos deixar construir nossa própria história, dedico todas as conquistas com a mais profunda gratidão e principalmente nosso respeito.
AS REPÚBLICAS:
Fora da presença dos que nos prepararam para o mundo, encontramos novas famílias, que não são capazes de substituir as originais. São elementos que somam, agregam, e que vivemos intensamente dia a dia em cada uma delas. Deixo minha homenagem a todas as repúblicas, lares sagrados que hospedaram reuniões de trabalho, bebedeiras, rodas de conversa dos mais diversos assuntos e que em todos os dias dessa trajetória foram nosso Lar Doce Lar. Viraram nosso sobrenome, capazes de nos identificar até nas maiores loucuras, mesmo cobertos pela lama de uma tenda de Caipirusp.
É possível se lembrar de cada detalhe de todas as casas por onde passei, como morador, agregado ou visitante. Nada começou ou terminou fora delas. Comunidades capazes de criar laços entre nós, seria injusto citar somente algumas, mas a todas em que fui muito bem recebido agradeço profundamente. Curtimos cada festa, e, como bons alunos da Escola de Engenharia de Lorena, o esquenta e o after eram LEI.
Saímos das comunidades do Orkut e fundamos as nossas reais redes sociais, sentados no sofá de uma casa e discutindo desde as mais diversas besteiras possíveis até os mais refinados assuntos. Foi lá que compartilhamos a ansiedade de cada nota e trocamos experiências válidas não só para as matrículas do próximo semestre. Experiências que vamos carregar para a vida.
A LORENA:
Reservei uma parte desse momento para falar de um lugar complexo, capaz de despertar sentimentos duais. Sentimos por este lugar talvez algo próximo que seus moradores nativos sentem por nós, Amor e Ódio. Fomos agentes transformadores desta cidade, projetos sociais, ações globais e ao mesmo tempo transformamos a nem tão pacata Lorena. Propagamos o amor por Lorena, que recebera fama de Cidade Universitária, e ao mesmo tempo geramos o caos andando de saias coloridas, samba-canção, cabelos coloridos, fantasias e som alto. Serei breve quanto a esse lugar que amo. Obrigado por tudo, Lorena.
AO TRABALHO:
Na reta final, conhecemos o tal do Mercado, trocamos o abadá e samba-canção azul pelos ternos, gravatas, uniformes, botas, capacetes e tudo mais. Experimentamos a competitividade e entendemos que, nesse novo universo, como diria o poeta, “O mais forte engole o mais fraco”.
Deixo aqui a minha preocupação. Mantenham sempre o equilíbrio, “jamais perca o seu equilíbrio”. Talvez esse seja um momento de autocrítica, no qual me pego refletindo todos os dias por não ser tão capaz de me desligar. Vejo essa característica como a maior fragilidade que um jovem com toda a sua motivação e poder de transformação pode cometer ao buscar o sucesso profissional sem temer por não conciliar sua vida pessoal.
Espero que todos nós sejamos muito mais que um perfil vazio, ou melhor, um perfil lotado de coisas vazias no LinkedIn. Que possamos manter firme a nossa postura e atitude transformadora que nos caracteriza por ser EEL.
A HOJE:
Por fim, agradeço novamente aos formandos por me concederem a oportunidade de falar por vocês e desejo os mais sinceros parabéns a todos os presentes pelo dia de hoje.