Vale a pena gastar dinheiro público em uma olimpíada internacional?

Quem está levando 200 estudantes brasileiros para uma olimpíada internacional de matemática no Japão? Quem organiza essa competição? São oficiais? São sérias? Esse investimento – principalmente para redes públicas com tantas carências e demandas mais urgentes –  é justificável? Estas questões polêmicas aparecem sempre quando escolas públicas vão participar de olimpíadas de conhecimento no exterior, como é o caso da Olimpíada Internacional de Matemática da Ásia (AIMO), disputada no Japão, de 2 a 6 de agosto.

Na opinião de gestores de escolas públicas, o investimento vale a pena. A escola estadual Juscelino Kubitschek, em Venda Nova, na periferia de Belo Horizonte, iniciou já há alguns anos um projeto de olimpíadas do conhecimento, com o objetivo de acreditar no potencial dos jovens e fomentar oportunidades. “O caminho não é simples. Em uma escola pública da rede estadual, muitas vezes faltam recursos. As olimpíadas do conhecimento se revelam ferramentas pedagógicas muito importantes”, relata a diretora Cristina Andrade Pereira.

Ela conta que estas competições despertaram a motivação e o gosto pela matemática e ajudaram a revelar talentos, além deles terem se tornados, pela primeira vez, protagonistas. “A autoconfiança foi um dos maiores ganhos. Ver seus olhos brilhando ao receber a notícia de que representariam o Brasil foi uma das experiências mais gratificantes da minha trajetória profissional. Esse projeto mostrou que a escola pública tem um papel fundamental na formação de jovens capazes de alcançar os mais altos patamares do conhecimento”, afirma.

Ozimar Pereira, diretor da Rede POC,  instituição privada de intercâmbio científico juvenil e responsável pela Secretaria Regional da AIMO no Brasil desde 2017, reconhece que é preciso critérios claros na aplicação do dinheiro público em função da limitação dos recursos. Um destes critérios são os resultados obtidos com os investimentos. “Pela percepção nossa, pelos resultados que nós observamos, pelos depoimentos, o resultado é imenso”, diz. Na AIMO de 2025, o Brasil levou 200 alunos e obteve 72 medalhas. 

Leia também: Brasil conquista 72 medalhas na Olimpíada de Matemática na Ásia

Ozimar reconhece ainda ainda falta muito para que as redes públicas tenham acesso aos evento internacionais deste tipo. “Nós temos quase 6 mil municípios no Brasil e a participação em eventos internacionais de qualquer tipo é muito rara”.  Ele cita os casos de Içara e Criciúma, em Santa Catarina, que investem em olimpíadas do conhecimento. “Em Criciúma, os professores criaram um clube de matemática; é um trabalho fantástico; a prefeitura enfrentou questões legais e conseguiu investir na AIMO“, frisa. Ozimar lembra que os ótimos resultados repercutiram na Câmara Municipal, em toda a rede municipal, nas escolas, professores e principalmente no ensino de matemática. “Os resultados, independente de ganhar medalha ou não, extrapolaram a escola e impactaram toda a cidade”, diz.

A professora Nerilda Felisberto, secretária municipal de educação de Içara, em Santa Catarina, destaca que o investimento na AIMO valeu a pena. “Ela oportuniza a todos os alunos de todas as redes a mostrarem o quanto são habilidosos na matemática. Levamos bronze e estamos muito felizes”, comemora. Na visão dela, estas competições internacionais são importantes para “descobrir talentos, potencializar estudantes, proporcionar novas descobertas, viver outras realidades”. Nerilda afirma que pretende continuar participando deste tipo de olimpíada. “Queremos fazer história no nosso município, além de transformar vidas e caçar talentos”, diz. 

O tenente coronel  Barsante, subdiretor da rede Tiradentes da Polícia Militar de Minas Gerais, afirma que o perfil sócio econômico da rede de escolas civil-militar é muito diverso, já que atende a 25 mil alunos em 30 unidades distribuídas em 26 munícipios do Estado. “Por se tratar de uma escola pública, a participação em eventos desta magnitude depende do desenvolvimento de projetos voltados a captação de recursos financeiros para subsidiar a participação dos alunos, vez que não há um orçamento garantido para estas participações”, afirma.  

A rede viajou para o Japão com uma delegação de 10 alunos da unidade Argentino Madeira. Os alunos estavam distribuídos do 9º ano fundamental ao 3º ano do médio. “Por ser a nossa primeira participação, termos dois alunos com medalhas de bronze é um grande resultado”, comemora o militar.  

Apesar das limitações orçamentárias, ele entende que as olimpíadas “incentivam e premiam o desempenho dos alunos”. “Elas são uma forma de verificação de aprendizagem e de estímulo aos alunos e os ajuda a encararem desafios cognitivos fora do ambiente escolar, além de serem excelentes oportunidades de intercâmbio cultural”, diz.

O professor Wellington Moraes do Espirito Santo, coordenador de matemática da escola cívico-militar Marcantonio Vilaça II, de Manaus, acredita que o investimento na AIMO compensou. “De oito alunos, nós conseguimos cinco medalhas de bronze e três menções honrosas. É uma competição de alto nível no que se refere a matemática, pois vários países de nacionalidades e costumes diferentes participaram da prova”, afirma.

Ele ressalta ainda o caráter multiplicador desta competição. “Nossos alunos são exemplos para os mais de 400 mil alunos da rede estadual de Educação. Mostrando que sim, podemos competir com estudantes do outros países e trazer medalha com esforço e dedicação”, afirma.

O diretor da Rede POC, Ozimar Pereira, diz ainda que estas competições “puxam para cima as escolas”, sejam elas públicas ou particulares. “A régua sobe muito e a experiência que eu tenho é que a escola sobe de patamar, de expectativa, da perspectiva. Uma boa educação é o que falta para o Brasil se tornar uma potência”, afirma.