Mesmo em tempo de pandemia, a cidade de Sobral (CE) continua surpreendendo quando o tema é educação. Na próxima quarta, dia 3, em parceria com a Universidade de Columbia (EUA), a rede pública de ensino fundamental 1 e 2 fará o lançamento de um projeto de reformulação completa do ensino de Ciências na cidade, incluindo novos laboratórios e um novo currículo.
Elaborado por especialistas brasileiros e internacionais liderados pelo professor Paulo Blikstein, de Columbia, o novo currículo de Ciências é alinhado não só à nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), mas também aos currículos dos EUA, Austrália, Canadá, Singapura e da OECD/PISA, e baseado na abordagem educacional do projeto FabLearn, idealizado e coordenado por Blikstein, com presença em 22 países. O currículo começa a ser aplicado nas escolas da rede a partir do próximo ano. Também serão inaugurados mais oito laboratórios FabLearn, que se somam aos dois já existentes na rede, chegando a quase 50% das escolas de ensino Fundamental II do município. O projeto é uma parceria entre o Transformative Learning Technologies Lab (TLTL), da Universidade de Columbia e prefeitura de Sobral, com apoio e financiamento da Fundação Lemann.
O time do projeto conta com pesquisadores brasileiros e internacionais, como Cassia Fernandez, física e doutoranda na Universidade de São Paulo, Tatiana Hochgreb, cientista e doutora pela USP, pós-doutora por Caltech/UCSF e fellow na Universidade de Stanford e de Columbia, e consultores como Engin Bumbacher, doutor por Stanford e parte da equipe de currículo da OECD/PISA. Além disso, mais de 20 professores da rede participaram do processo por três anos, além da equipe da SEDUC/Sobral.
O novo documento, denominado Currículo IDEIA de Ciências (Invenção, DEscoberta, Investigação e Aprendizagem), já foi testado em projetos-piloto em várias escolas de Sobral e vem sendo ajustado em parceria com os professores da rede e com a participação dos alunos.
Segundo Blikstein, foram trabalhados três pilares paralelos para a elaboração do Currículo IDEIA de Ciências. O primeiro foi oferecer níveis diferentes para que escolas com realidades distintas possam progressivamente avançar na sua implementação de acordo com seus recursos. “É comum municípios e estados brasileiros nivelarem seus currículos pela escola menos favorecida da rede. No final, corremos o risco de nivelar por baixo e as redes ficam sem uma trajetória de evolução, o mínimo denominador comum vira o estado permanente. Não faz sentido em um país tão grande e diverso. Precisamos contemplar a diversidade sem perda de qualidade, e apontando um caminho de excelência para todas as escolas públicas”, explica.
O segundo pilar foi a formação do professor. Como parte do projeto, cada escola que recebeu um laboratório contratou um novo professor para ser o responsável pelo espaço e pela criação de novas atividades interdisciplinares na escola. Segundo Cassia Fernandez, co-autora do documento, “As escolas de Sobral que terão laboratórios FabLearn precisam de professores que saibam utilizá-los pedagogicamente. Esses novos professores estão em constante formação com especialistas da área, e em contato com todos os professores da escola, criando novas sequências didáticas durante o ano todo. Não é um currículo que está caindo de paraquedas. Foi construído em parceria com os docentes”, destaca.
O terceiro pilar envolveu a participação dos alunos. Tatiana Hochgreb, outra co-autora, diz que, “Além de testar o currículo com os alunos por dois anos, fizemos uma oficina para ouvir dos estudantes quais temas eles gostariam de aprimorar e aprender. E eles têm interesses importantes – como aquecimento global, tecnologia, educação sexual, prevenção de doenças. Querem menos aulas teóricas, mais investigação e mais valorização da cultura brasileira e local. É importante ter um canal de escuta com os alunos com regularidade. Queremos que os alunos de Sobral aprendam a fazer ciências, não só saber sobre ciências”.
Desde 2015 o município de Sobral figura entre os primeiros lugares no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, o Ideb. A educação é amplamente elogiada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em suas publicações, destacando que, em 2005, o município cearense ocupava a 1366º lugar nacional no Ideb. Dez anos depois, alcançou o primeiro lugar e até hoje está entre as melhores redes públicas de educação do Brasil.