Mão na massa! Espaços Makers estimulam o “aprender fazendo”
Matéria publicada pelo Sinepe – RS em 30/05/2022
Com resultados de ganho de criatividade e trabalho em grupo entre os estudantes, escolas e universidades utilizam esse recurso de aprendizagem que possui várias formas de implementação e investimentos.
Da tesoura a uma máquina de usinagem. Da imaginação para o concreto. O espaço maker é um ambiente de ensino-aprendizagem que busca criar condições de se colocar a mão na massa. O ambiente permite o uso de tecnologias (tanto analógicas quanto digitais), possibilitando aos usuários a oportunidade de experimentar e aprender fazendo.
É uma maneira de desenvolver projetos interdisciplinares com uso de diversas tecnologias para potencializar as habilidades técnicas (hardskills) e sociais (softskills).
O empreendedorismo, a experimentação, o compartilhamento, a aprendizagem criativa, o espírito colaborativo. Este é um espaço que trabalha com essas competências, todas importantes para a área do conhecimento. Visando essa integração, esse formato de ensino tem obtido atenção de instituições de ensino, desde escolas a universidades.
Escola e universidade: as diferenças para implementar
As realidades entre uma escola e uma universidade são bem diferentes, o que se confirma em relação ao espaço maker. Conforme salienta o professor e pesquisador da Universidade do Vale do Itajaí (Univali) e membro do Comitê Gestor da Rede de Inovação na Educação Brasileira do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb), André Raabe, no Ensino Básico são atendidas todas as possíveis carreiras, enquanto no Ensino Superior já existe uma escolha prévia profissional, direcionada para determinados temas e interesses.
Para as escolas, o espaço maker tem o objetivo mais amplo de prover um ambiente de experimentação, de os jovens pensarem como inventores. Nas universidades, auxilia nas disciplinas que demandam mais práticas, podem fazer relações teóricas com a prática, construções de protótipos e projetos, o que abre uma perspectiva mais ampla para o aprendizado.
“Para todas as idades, a proposta é proporcionar projetos de vida que são desenvolvidos continuamente com o apoio do espaço maker. Não precisa ser um espaço fechado mas, sim, aberto”, frisa.
No artigo “Maker: uma nova abordagem para tecnologia na educação”, de 2018, elaborado de forma conjunta com o professor Eduardo Borges Gomes, Raabe faz um comparativo entre aspectos pedagógicos.
A montagem e a manutenção
Definido qual o público que vai utilizar o espaço maker, a partir desse momento podem ser definidos quais os equipamentos a serem adquiridos. “Existe um modelo internacional de laboratório de fabricação digital que pode ser utilizado”, recomenda o coordenador Regional do Programa Educação Conectada MEC/Undime para a Região Sul, Jocemar do Nascimento.
Exemplificando, em uma escola de Ensino Fundamental, são selecionados alguns equipamentos de níveis de segurança adequados para as determinadas faixas etárias, que seriam kit robótica, automação e eletrônica, impressora e cortadora laser, entre outros, para vários tipos de projetos. Além disso, há os insumos para esses equipamentos, que, em geral, têm baixo custo.
O site porvir.org elaborou um simulador de como montar um espaço marker na escola, para os ensinos fundamental e médio. É relacionada a lista de equipamentos e seus custos, além de sugestões de atividades pedagógicas para atender uma turma de 30 alunos durante seis meses.
A manutenção vai depender dos equipamentos, mas se trata de uma despesa que fica na faixa de R$ 1 mil a R$ 5 mil mensais. O investimento parte de cerca de R$ 30 mil.
Quais são os resultados possíveis?
É percebido um alto grau de engajamento dos alunos por vivenciarem um espaço tão diferente do tradicional. Afinal, um makerspace é o local das bancadas de trabalho colaborativo, das conversas e das trocas de ideias. É o que enfatiza a professora do Instituto Singularidades e doutora em Comunicação e Semiótica e mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital, Juliana Caetano.
Essa mudança é vista logo de cara em crianças, jovens e adultos.
“Além disso, é claro, dependendo do grau de intencionalidade pedagógica, os resultados são vistos a curto prazo, no que tange ao entendimento de criar algo prazeroso. Errar faz parte e trabalhar junto é rico”, diz.
De médio e longo prazos, os ganhos são com estudantes autônomos na gestão de projetos autorais, desenvolvendo competências como raciocínio lógico, criatividade e comunicação super desenvolvidas. “E o melhor, com o sentimento de que estar na escola realmente serviu para algo”, complementa.
Ressignificando aprendizados em colégio
Durante a pandemia, em 2020, uma sala de aula convencional foi transformada em espaço maker no Colégio São Carlos, de Caxias do Sul. Em lives pelo Google Meet, os jovens puderam experimentar pela primeira vez esse tipo de educação, mesmo de maneira virtual. Com a volta das aulas presenciais, em 2021, foi o momento da “mão na massa” ser concretizada.
A sala, utilizada por todos os anos da instituição escolar, tem a proposta de trabalhar a ressignificação. “Todo o ano tem o ‘carrinho de balão’, que pode ser feito caixa de papelão, remédio ou leite. Nessa atividade, as crianças pequenas podem perceber qual carro corre mais e os motivos para isso. Já para os maiores, fica mais complexo, pois usam trena para fazer as medidas e entender a aceleração do carrinho”, comenta a coordenadora pedagógica de Educação Infantil e Ensino Fundamental I do Colégio São Carlos, Taís Pagliarin.
Outro exemplo de dinâmica é com os alunos do primeiro ano do Ensino Fundamental. Para aprender as letras do alfabeto, as crianças precisam materializá-las com objetos. “O ‘A’, de aranha, foi representado com galhos, como se fossem as teias, e com caixas de ovos, o animal em si. São formas de ressignificar a aprender uma letra ou palavra”, comenta.
A educação financeira também tem aplicação em um espaço maker. Desde crianças, os alunos aprendem a poupar por meio de pequenos cofres ou simulando compras em um minimercado. “Os mais pequenos aprendem com números inteiros e os maiores os números com vírgulas, tudo para entender como funciona o sistema monetário”, diz.
Em relação aos resultados, a coordenadora pedagógica destaca um crescimento de criatividade e trabalho em equipe entre os estudantes. “Com o retorno das aulas presenciais, muitos alunos tiveram dificuldades para socializar com seus colegas. O espaço maker ajuda a ter empatia entre eles. As ideias são compartilhadas, pois trabalham em pares e equipes. Existe muito o desenvolvimento de como pensar estratégias, além de estimular o raciocínio e a lógica”, complementa.
Interdisciplinaridade na execução de projetos
Na universidade, as tecnologias são mais complexas, equipamentos mais robustos, mas a cultura da experimentação é a mesma. “No nosso caso, já tínhamos laboratórios com essa cultura, por terem nascido na escola da indústria criativa, especificamente nos cursos da área do Design, em 2007. Para implantar busca-se criar esse espaço com recursos internos ou externos”, comenta o coordenador dos Laboratórios da Indústria Criativa POA/ FabLab da Unisinos, André Canal Marques. A partir de 2017, a universidade se vinculou à rede mundial Fab Lab, iniciada pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT).
A universidade possui três laboratórios FabLab e outros espaços com o conceito “maker” em seus dois campi. “O nosso é o foco educacional, sem cobrança do uso dos equipamentos. Então é através dos cursos de graduação e pós-graduação, mas também busca-se através de editais de fomento externos também, como Fapergs, Finep etc.”
Para usar o espaço maker, tanto o professor como o próprio aluno podem reservar equipamentos e ambientes. “Possuímos um técnico laboratorista para controlar e ajudar a operar”, complementa.
Conta com equipamentos para desenvolvimento de modelos e protótipos nos mais diversos materiais. Entre os equipamentos disponíveis, estão: equipamentos de marcenaria, máquina vaccum forming, injetora manual, mini extrusora de polímeros, scanner 3D; Impressoras 3D (método 3DP), máquina de corte a laser, máquinas de costura industriais e portáteis, componentes eletrônicos para prototipação (arduinos, lypads), entre outros.
O coordenador do FabLab destaca que aprender fazendo e experimentando construir e realizar protótipos rapidamente. “É errar logo, no sentido de testar, materializar logo a ideia. Poder corrigir de maneira mais rápida e barata. Outros pontos são os estímulos à criatividade, à colaboração e ao trabalho em equipe”, enfatiza.
Os espaços maker permitem potencializar o desenvolvimento de projetos entre cursos variados. “Alunos da gastronomia, do design e da fotografia já fizeram prototipagens utilizando, por exemplo, impressora 3D para moldes de plástico ou silicone para um doce em que seria feita uma foto profissional. Houve uma união de competências”, ressalva.