Desafios da aprendizagem híbrida
Coluna de Antônio Gois publicada no OGLOBO em 13/06/2022 – No campo educacional com frequência surgem propostas que rapidamente ganham ares de soluções inovadoras para problemas estruturais. Às vezes, podem até ser isso. Mas é muito comum que conceitos antigos reapareçam com roupagem nova ou que práticas ainda não devidamente testadas tenham visibilidade impulsionada pelos mais diversos interesses, que vão desde objetivos meramente comerciais até o desejo genuíno de contribuir para a melhoria da educação. Separar o joio do trigo não é uma tarefa simples, mas ela pode ser facilitada se primeiro tivermos clareza sobre o que está sendo proposto, quais as evidências disponíveis, e ao mapearmos riscos e oportunidades a serem considerados antes de optar por sua adoção em massa.
É exatamente esta a proposta do relatório “Aprendizagem Híbrida? Orientações para regulamentação e adoção com qualidade, equidade e inclusão”, que será lançado hoje no Encontro de Aprendizagem Híbrida, em São Paulo. De autoria dos pesquisadores Paulo Blikstein, Lívia Macedo, Mariana Edelstein, Fabio Campos, Rodrigo Barbosa e Silva e Renato Russo, o documento foi elaborado pelo Transformative Learning Technologies Lab (TLTL), da Universidade de Columbia, e pela associação D3E, com apoio da Fundação Telefônica Vivo e do Centro Lemann da Universidade de Stanford. Ele sugere uma definição comum para a aprendizagem híbrida, mostra que ainda não há evidências sólidas de que ela funcione, e propõe alguns caminhos a percorrer antes de pensar em sua adoção como política pública em massa.
O relatório defende que o termo aprendizagem (ou educação/ensino) híbrida defina atividades que incentivem o trabalho construcionista (ao permitir que estudantes participem de experimentos e projetos enriquecedores em contextos físicos diversos, com autonomia de tempo e espaço para as atividades); considerem a importância do professor e de sua formação para atuar nessa modalidade; respeitem fatores externos fundamentais para a aprendizagem (como o espaço de estudo, acesso igualitário a equipamentos e conexão, contexto familiar e saúde mental do aluno e educador); e combinem momentos de aprendizagem presenciais (na escola) e remotos (em casa ou em outros espaços).
Buscar uma definição comum não é mero exercício teórico. Ao longo da pandemia, por exemplo, escutamos bastante sobre várias iniciativas de aprendizagem híbrida sendo realizadas pelas escolas. Na maioria dos casos, porém, tratou-se da mera transposição para o ambiente virtual de dinâmicas de sala de aula tradicional, uma prática comprovadamente ineficaz.
Outro ponto realçado é que qualquer regulação desta modalidade precisa considerar ao menos três contextos: situações emergenciais (como no auge da pandemia), momentos em que é necessário focar na recuperação de aprendizagens (o que vivenciamos hoje), ou como um componente regular, com foco na ampliação da oferta e na inovação pedagógica. Para cada situação, as estratégias de implementação e a regulação precisam ser distintas. Em todos elas, porém, é necessária a atenção às condições de acesso dos estudantes às tecnologias, sob o risco de se ampliarem ainda mais as desigualdades.
Outro ponto realçado é que qualquer regulação desta modalidade precisa considerar ao menos três contextos: situações emergenciais (como no auge da pandemia), momentos em que é necessário focar na recuperação de aprendizagens (o que vivenciamos hoje), ou como um componente regular, com foco na ampliação da oferta e na inovação pedagógica. Para cada situação, as estratégias de implementação e a regulação precisam ser distintas. Em todos elas, porém, é necessária a atenção às condições de acesso dos estudantes às tecnologias, sob o risco de se ampliarem ainda mais as desigualdades.